90 anos do voto feminino: as políticas públicas e os direitos das mulheres
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90 anos do voto feminino: as políticas públicas e os direitos das mulheres

90 anos do voto feminino: as políticas públicas e os direitos das mulheres

A liberdade e o direito das mulheres é frequentemente pauta de discussões e estudos. Na semana em que é celebrado os 90 anos da conquista das mulheres ao direito de votar, o IPPDS entrevistou integrantes do grupo de estudos que tem como uma das suas linhas de pesquisa o feminismo e a política: o NIEG – Núcleo Interdisciplinar de Estudos de Gênero. O grupo, criado em 1999, é integrado ao Centro de Ciências Humanas Letras e Artes (CCH) da Universidade Federal de Viçosa (UFV) é vinculado ao Instituto de Políticas Públicas e Desenvolvimento Social. Em seu currículo, somam-se dezenas de pesquisas e atividades de extensão ligadas à temática, entre eles, o Programa Casa das Mulheres que ofereceu uma rede de acolhimento e encaminhamento de mulheres em situação de violência em Viçosa.

Foto: arquivo Biblioteca Nacional

Para entendermos o caminho que ainda há a trilhar para alcançar a igualdade de direito entre homens e mulheres, primeiro precisamos voltar na história. Isso porque o direito ao voto foi por muito tempo, um privilégio de poucos, homens e possuidores de bens. O sufrágio universal estabelecido na França quase na metade do século XIX igualou os cidadãos sem distinção de classe, porém, excluindo desse direito às mulheres, que deveriam permanecer à margem da comunidade política. A partir da consolidação deste direito à todos os homens questionou-se então a extensão do direito de voto às mulheres. Os primeiros passos do movimento sufragista feminino surgiram em vários países do ocidente, mas foi na Inglaterra que tomou maior visibilidade.

 Alguns registros apontam que a primeira manifestação em prol do voto feminino no Brasil foi noticiada em 1910, em Salvador, em um encontro que teve a intenção de fundar um partido político, o Partido Republicano Feminino. Outros movimentos importantes para a conquista do voto feminino no Brasil foram a Federação  Brasileira  para  o  Progresso  Feminino – FBPF – e a Liga  para  Emancipação  Intelectual  da  Mulher. A partir de 1917, alguns parlamentares também apresentaram emendas e projetos em prol do alistamento feminino, mas foi só com o Decreto nº. 21.076,  de  24  de  fevereiro  de  1932, que garantiu o direito da mulher ao voto pela primeira vez no Brasil, ainda que restrito pois dependia da  permissão  do  esposo, se casada,  e  as  viúvas  e  solteiras  se possuíssem renda própria.

Mas a participação plena das mulheres nos espaços democráticos ainda tem um longo caminho a ser trilhado, perpassando principalmente pela  construção de políticas públicas. De acordo com a professora Mariana Procópio, pesquisadora do Nieg e colíder do Diz (Grupo de Pesquisa em Discursos e Estéticos da Diferença), compreender as relações sociais em suas diferentes dimensões, sobretudo no que se refere às desigualdades de gênero, permite que possamos identificar problemas históricos e estruturais, tais como as hierarquias de poder, a invisibilidade social das mulheres (e de outros grupos vulneráveis), as situações de opressão e violência. Nossos estudos são elementos fundamentais para instrumentalizar e provocar reflexões que subsidiam a construção de políticas públicas para a redução dessas desigualdades e para garantir a efetivação dos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e da cidadania. Essas pesquisas são também fundamentais para a superação de barreiras materiais e simbólicas aos processos de emancipação das mulheres e para a criação de um ambiente de reconhecimento político, legal, social e cultural da diversidade, capaz de auxiliar na construção de uma sociedade livre, justa e solidária.

Um exemplo de como essas políticas públicas são importantes pode ser ilustrada na vida da vereadora Jamille Gomes. Filha de uma economista que criou três filhos sozinha, com o apoio de benefícios como Bolsa Família, Vale gás, Bolsa Escola e outros programas sociais. A parlamentar credita a esse apoio também, somado à outras políticas públicas, a possibilidade de ter ingressado em um curso superior em uma universidade pública. Foi durante a sua gravidez enquanto cursava a graduação em Pedagogia na UFV que o direito das mulheres  passou a ser visto de forma mais aprofundada pela parlamentar. “Comecei a pesquisar ainda na graduação sobre a divisão sexual do trabalho e no mestrado aprofundei mais esse conceito, com a pesquisa de mestrado sobre mulheres das ciências exatas ocupando esses espaços masculinizados e conciliando o trabalho com a maternidade”, explica. Analisando dados sobre a participação de mulheres na política, veio a decisão de se candidatar ao legislativo municipal em 2020 para dar colocar o tema sobre o trabalho doméstico realizado pelas mulheres em discussão no debate público. “É importante que tenham mulheres mães construindo políticas públicas porque assim a gente coloca o nosso olhar, a nossa vivência, na construção dos projetos de lei, nos requerimentos que a gente envia e nas proposições que a gente faz”, pontua a parlamentar.

Sendo uma mulher jovem ocupando um cargo político, a vereadora conta que muitas vezes não se sente tratada da mesma forma que seus pares do sexo masculino. Outro ponto também importante que merece destaque, na visão da parlamentar, é o número de mulheres que ocupam cargos públicos. Essa participação feminina, apesar de quase um século da conquista, ainda não atingiu a sua potencialidade. Analisando os números de parlamentares do Congresso Nacional, de 513 deputados, temos apenas 15% de mulheres. Na Câmara Municipal de Viçosa são apenas 3 mulheres ocupando as cadeiras do Legislativo, contabilizando apenas 7 vereadoras mulheres em 20 anos.

Se formos analisar o cenário atual, 90 anos após a conquista do voto, nós [mulheres] somos mais de 50% da população e ainda assim estamos sub-representadas nesses espaços institucionais, sobretudo no parlamento. “Ainda tem muito que avançar e lutar para que a participação das mulheres seja efetiva, considerando também todos os recortes, de raça, de classe, nessa representatividade”, salientou Jamille, que também ressaltou os desafios de ser parlamentar mulher e jovem exemplificando situações em que não foi ouvida, ou ter sido interrompida, deslegitimada e até desconsiderada em seus posicionamentos, mesmo que tendo a mesma abordagem que colegas do sexo oposto. “Isso inúmeras vezes e de forma muito velada. Então são os desafios.”, concluiu.

Referências Bibliográficas

KARAWEJCZYK, Mônica. As filhas de Eva querem votar. Dos primórdios da questão à conquista do sufrágio feminino no Brasil (c.1850-1932). 398 f. Tese (Doutorado em História). Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2013.

BARBOSA, Erivaldo Moreira; MACHADO, Charliton José dos Santos. Gênese do direito do voto feminino no Brasil: uma análise jurídica, política e educacional. Revista HISTEDBR on-line, Campinas, n. 45, p. 89-100, 2012.

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